24 agosto, 2014

Assedio no ambiente academico.

Assédio sexual impede o progresso feminino no mundo científico




Publicado há 2 dias - em 22 de agosto de 2014 » Atualizado às 10:55
Categoria » Violência contra Mulher
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Levantamentos feitos com cientistas e jornalistas que cobrem ciência apontou que a maioria já foi vítima de algum tipo de assédio por parte de professores, orientadores e fontes

Quando cursava biologia, passei várias semanas de verão na Costa Rica com um estudante mais velho num projeto de pesquisa nas profundezas da floresta. Éramos somente nós dois e, ao chegar ao local, descobri que ele havia reservado um quarto só para nós dois, com uma cama.

Atormentada, mas com medo de ser chamada de pudica ou difícil, não criei caso. Puxei o dono do hotel de lado no dia seguinte e solicitei uma cama. O problema terminou ali, e meu chefe estudante nunca tentou nada fisicamente.

Pensando melhor, fico surpresa em como eu estava despreparada para lidar com esse tipo de situação, principalmente aos 19 anos. Indubitavelmente, minha faculdade tinha uma polícia contra assédio, mas tais recursos estavam a milhares de quilômetros de distância. Eu estava sozinha num país estrangeiro e nunca fora ensinada sobre meus direitos e recursos nessa área.

Eu havia me esquecido dessa experiência de duas décadas atrás até que li um relatório publicado em julho no periódico “PLOS One”. Kathryn Clancy, antropóloga da Universidade de Illinois, campus de Urbana-Champaign, e três colegas usaram e-mail e a mídia social para convidar cientistas a preencher um questionário online a respeito de suas experiências com assédio e agressão durante pesquisas de campo; eles receberam 666 respostas, três quartos delas de mulheres, de 32 disciplinas, inclusive antropologia, arqueologia, biologia e geologia.

Quase dois terços dos participantes disseram que sofreram assédio sexual durante pesquisas de campo. Mais de 20% relataram agressões sexuais. Estudantes ou alunos de pós-doutorado e mulheres mostravam maior probabilidade de serem vítimas dos superiores. Poucos participantes afirmaram que o local da pesquisa tinha um código de conduta ou política relativa a assédio sexual, e das 78 pessoas que ousaram relatar incidentes, menos de 20% se deram por satisfeitas com o resultado.

Os resultados são depressivamente parecidos aos dados que colegas e eu coletamos neste ano com um questionário online enviado a divulgadores científicos. Nós recebemos respostas de 502 redatores, a maioria composta por mulheres, e apresentamos os resultados no Instituto de Tecnologia de Massachusetts em junho, durante conferência sobre mulheres que trabalham com jornalismo científico, com patrocínio da associação nacional que nos representa.

Mais da metade das mulheres que responderam afirmaram que não foram levadas a sério por causa do seu gênero, uma a cada três sofreu percalços no progresso na carreira e praticamente metade sustentou não ter recebido crédito por suas ideias. Quase metade disse ter sido paquerada ou ter ouvido comentários sexuais, e uma em cada cinco sofreu contato físico indesejado.

Em função da natureza voluntária, não se pode esperar que nenhum dos relatórios nos conte a verdadeira incidência da discriminação sexual e do assédio entre cientistas e jornalistas científicos. Ainda assim, o volume de respostas nos passa um recado inconfundível: após quatro décadas desde a lei que proibiu discriminação sexual na educação pública nos Estados Unidos e 23 anos após Anita Hill ter colocado o assédio sexual sob os holofotes, a parcialidade e o assédio continuam a impedir o progresso feminino.

Clancy afirma que decidiu coletar os dados depois de ser esmagada pelas respostas a uma postagem que publicou em seu blog na revista “Scientific American” em 2012. Uma estudante, “Neblina”, recontou sua vida durante a faculdade:

“Meu corpo e minha sexualidade eram discutidos abertamente pelo meu professor e os alunos”, escreveu a mulher. “Seguiam-se comentários sobre o tamanho grande de meus seios, e ouviam-se especulações sobre minha história sexual.” O professor “costumava brincar que somente mulheres bonitas podiam trabalhar com ele, o que me levou a indagar se meu intelecto e capacitação tinham relevância”.

Os comentários e e-mails jorraram, disse Clancy. “Uma história logo virou duas e, rapidamente, pareceu serem cem”.

Igualmente, nossa pesquisa com redatoras nasceu das conhecidas acusações de assédio contra um famoso editor que foi mentor de muitas jornalistas. Os incidentes levaram as mulheres a revelar suas histórias de discriminação no decorrer da profissão.

Segundo Clancy, no meio acadêmico, acusações de assédio sexual e estupro costumam ser administradas internamente, criando incentivos poderosos para encobrir o mau comportamento, principalmente entre agressores com influência e poder.

“Escutei muitas histórias sobre o professor que não tem permissão de estar no mesmo recinto com fulana ou beltrana”, ela contou. Às vezes, os agressores se beneficiam se livrando de tarefas de aprendizado desagradáveis sem perder o emprego.

O assédio entre jornalistas científicos gerou uma hashtag, #ripplesofdoubt, para descrever como ele enfraquece as mulheres. Mulheres ignoradas para cargos se questionam se foram rejeitadas em função do visual e não pelo trabalho. Outras temiam não ter alcançado a posição por mérito.

De fato, os dados sugerem parcialidade em decisões de orientação. De acordo com estudo publicado neste ano, uma equipe de pesquisadores liderada por Katherine L. Milkman, da Universidade da Pensilvânia, enviou cartas idênticas, supostamente de estudantes, a mais de 6.500 professores de 259 universidades pedindo para discutir oportunidades de pesquisa. Os professores estavam mais propensos a responder ao e-mail de “Brad Anderson” do que de candidatas fictícias com nomes como Claire Smith ou Juan Gonzalez. Esse tipo de parcialidade perpetua a discriminação.

“Nosso mundo é pequeno e os recursos, escassos”, disse outra autora do relatório publicado em “PLOS One” Julienne Rutherford, bióloga e antropóloga da Universidade de Illinois, campus de Chicago. Para ela, se mulheres são dissuadidas ou excluídas de algumas oportunidades, as perdas para a ciência são enormes.

Ano passado, na conferência anual de jornalistas científicos, juntei-me a cinco importantes jornalistas mulheres para apresentar os dados que havíamos coletado sobre as disparidades de gênero em autoria, cargos de nível elevado, prêmios e salários, e para recontar histórias da época em que nosso gênero atrapalhou nossas carreiras.

A seguir, longas filas se formaram aos microfones enquanto pessoas na plateia se levantavam para contar suas histórias. Mulheres jovens contaram ter sido assediadas pelas fontes. Jornalistas tarimbadas recordaram de chefes de mãos inquietas.

Homens se levantaram para oferecer apoio. O diretor de um famoso programa de jornalismo científico disse que da próxima vez que uma aluna confidenciasse ter sido assediada durante estágio, ele iria intervir; aparentemente, a ideia não lhe ocorrera antes.

Em sua maioria, os homens não são sorrateiros, mas têm um papel poderoso a desempenhar aqui. Durante viagem a uma conferência de jornalismo alguns anos trás, tive uma conversa envolvente com um dos principais palestrantes. Quando nos despedimos, ele me disse, diante de dois outros homens, “seu marido não deveria deixar você sair de casa”.

Os dois observadores consideraram essa fala insultuosa um elogio. Foi mais fácil para eles ignorarem do que chamar a atenção de um amigo, e seu comportamento mostrou que não havia problemas em me tratar assim.

Quer o assédio ou a discriminação aconteça num local de pesquisa na Costa Rica ou na sala de conferência, o problema não será solucionado com novas regras arquivadas em sites não lidos. A responsabilidade de resistir não deveria ficar somente a cargo das vítimas. As soluções exigem uma mudança de cultura que somente pode começar de dentro.

Será preciso que os diretores-presidentes, chefes de departamento, diretores de laboratório, professores, editores e redatores-chefes tomem uma posição e digam: pode ir parando com isso. Não me importa se você é meu amigo ou colega preferido; nós não tratamos mulheres assim.

* Por Christie Aschwanden


http://www.geledes.org.br/assedio-sexual-impede-o-progresso-feminino-mundo-cientifico/#axzz3B84Mtv4y

16 agosto, 2014

Impostos e serviços publicos
O ator sueco e a sonegação da Globo
por Paulo Nogueira, no Diário do Centro do Mundo
Stellan Skarsgard é um ator sueco.
Aos 63 anos, um dos favoritos do cineasta Lars von Trier, tem uma carreira vitoriosa que lhe trouxe fama e dinheiro. Recentemente, ele concedeu uma entrevista na qual reafirmou seu amor pela Suécia.
“Vivo na Suécia porque o imposto é alto, e assim ninguém passa fome. A saúde é boa e gratuita, assim como as escolas e as universidades”, disse ele. “Você prefere pagar imposto alto?”, lhe perguntaram. “Claro. Se você ganha muito dinheiro, como eu, você tem que pagar taxas maiores. Assim, todo mundo tem a oportunidade de ir para a escola e para a universidade. Todos têm também acesso a uma saúde pública de qualidade.”
Skarsgard nasceu e cresceu numa cultura que valoriza o pagamento de impostos. Por isso a Suécia é tão avançada socialmente. Impostos, como lembrou ele, constroem hospitais, escolas, universidades. Pagam professores e médicos da rede pública, além de tantas outras coisas positivas para qualquer sociedade.
Essa cultura vigora também na Alemanha. Recentemente, o presidente do Bayern foi para a cadeia por sonegar imposto. Quando o caso eclodiu, as autoridades alemãs fizeram questão de puni-lo exemplarmente sob um argumento poderoso: nenhum país funciona quando as pessoas acreditam que podem sonegar impostos impunemente.
Agora, vejamos o Brasil. Há anos, décadas a mídia alimenta uma cultura visceralmente oposta. Imposto, você lê todo dia, é um horror. O Brasil tem uma das maiores cargas tributárias do mundo (o que é mentira). Imposto é uma coisa injusta. Bem, a mensagem é: sonegue, se puder. Parabéns, caso consiga.
Não poderia haver coisa mais danosa para os cidadãos do que esta pregação diuturna da mídia. Você os deforma moralmente. Tira-lhes o senso de solidariedade presente em pessoas como o ator sueco citado neste artigo.
Além de tudo, a cultura da sonegação acaba chancelando os truques praticados pelas grandes companhias de mídia para escapar dos impostos. Considere o caso célebre da sonegação da Globo na compra dos direitos de transmissão da Copa de 2002.
Nestes dias, vazou toda a documentação relativa ao caso. Uma amostra já tinha vindo à luz – na internet, naturalmente – algum tempo atrás, num furo do site Cafezinho. Só a cultura da sonegação pode explicar o silêncio sinistro que cerca este escândalo fiscal.
Até aqui, a Globo não deu uma única satisfação à sociedade. Não se desculpou, não se justificou. É como se nada houvesse ocorrido. Também a Receita Federal, até aqui, não disse nada. Mais uma vez, é como se nada houvesse ocorrido no âmbito da receita. Nenhuma autoridade econômica, igualmente, se pronunciou. De novo, é como se nada houvesse ocorrido numa área tão vital para a economia como a arrecadação de tributos.
E a mídia?
Bem, a mídia finge que não está acontecendo nada. Contei já: quando o Cafezinho publicou os documentos, falei com o editor executivo da Folha, Sérgio Dávila. Ponderei que era um caso importante, e ele aparentemente concordou porque logo a Folha fez uma reportagem sobre o assunto. Uma e apenas uma. Em seguida, a sonegação da Globo sumiu da Folha para nunca mais retornar.
Se conheço as coisas como funcionam nas redações, um telefonema de um Marinho para um Frias – as famílias são sócias no Valor — pôs fim à cobertura. Volto a Stellan Skarsgard. Em todo país socialmente desenvolvido, pagar impostos é uma coisa sagrada. E sonegá-los é um ato de lesa sociedade, passível de punição exemplar.
O Brasil sofreu uma lavagem cerebral da mídia. Uma das tarefas prementes de uma administração sábia é desfazer essa lavagem. Quando as palavras do ator sueco encontrarem eco no Brasil, seremos uma sociedade desenvolvida.http://www.viomundo.com.br/denuncias/paulo-nogueira-globo-e-o-mal-que-cultura-da-sonegacao-faz-ao-brasil.html
Corrupção , sonegaçao e Serviços publicos

Carga tributária, corrupção, senso comum e serviços públicos
17 de julho de 2013

Existe uma forma de pensar os problemas existentes nos serviços oferecidos pelo Estado, especialmente em Educação e Saúde, que está disseminada entre as pessoas e é sistematicamente reproduzida pela mídia: a absurda carga tributária brasileira gera uma quantidade enorme de recursos que, em função de desvios, fraudes ou afins – ou seja, da corrupção generalizada – não chegam onde deveriam chegar, explicando a insuficiência e má qualidade dos serviços públicos.

Na verdade, este raciocínio traz consigo uma série de distorções e esconde a real dimensão das questões que se colocam para o país.

Dados consolidados de 2011 mostram que a carga tributária brasileira naquele ano foi de 33,5% do PIB. Numa amostra com 30 países, este percentual coloca o Brasil numa posição intermediária, na 17ª colocação. De fato, estamos à frente de países como Chile (20,1%), EUA (24,8%) e Portugal (31,3%). No topo do ranking estão os países notoriamente conhecidos pela excelência nos serviços públicos: Dinamarca (48,2%) e Suécia (45,8%), sendo a carga tributária brasileira inferior a de países como Itália (43,0%), Eslovênia (37,6%) e Hungria (36,7%).

Ao contrário do senso comum, os dados mostram que o Brasil não tem a maior carga tributária do mundo. Mostram também que os impostos, como se vê pelos países escandinavos, são fontes imprescindíveis de recursos. A questão é que a “ira nacional” contra os impostos deveria ser dirigida aquilo que realmente importa: a) a composição da nossa carga tributária; b) a sonegação de impostos c) a destinação dos recursos.

Sobre o primeiro aspecto, dados também de 2011 revelam que quase 50% da nossa carga tributária provem da taxação de bens e serviços (consumo). Parcela relevante, aproximadamente 25%, da tributação sobre a folha salarial e os outros 25% dividem-se entre tributos sobre a renda (19%), sobre a propriedade (3%) e sobre as transações financeiras (2%). Evidencia-se o problema da regressividade do sistema tributário brasileiro, que incide proporcionalmente mais sobre os mais pobres (já que estes comprometem boa parte de sua renda com o consumo). Ao mesmo tempo, o patrimônio e a riqueza são preservados pelos tributos no Brasil.

Em relação à sonegação fiscal, estimativa do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional mostra que, no período de um ano, cerca de R$ 400 bilhões (10% do PIB) deixam de ser arrecadados. A permanência de parcela significativa da população na economia informal, as debilidades da fiscalização e brechas ou artifícios utilizados para não pagar impostos, essencialmente por grandes empresas e os mais ricos, explicariam este resultado.

No que tange à destinação dos recursos, ao contrário do que reza o senso comum, não é a corrupção que provoca os maiores problemas. Em artigo recente, o economista Samuel Pessoa da FGV, que não pode ser acusado de governista, menciona estudos que estimam um desperdício de R$ 6 bilhões por ano com a corrupção. De fato, esta é uma estimativa difícil, mas mesmo que não seja exatamente isso, trata-se de uma questão de ordem de grandeza. Os grandes escândalos de corrupção, isoladamente, envolvem montantes de milhões de reais, enquanto o orçamento público ou PIB se estabelecem em termos de bilhões de reais.

Parênteses: a constatação anterior, de forma alguma, justifica a corrupção, que é moralmente condenável se envolver um ou um milhão de reais (aliás, é curioso como alguns se mostram intransigentes ao condenar políticos e governantes, mas facilmente praticam “pequenos desvios” em suas vidas pessoais). Mas o fato é que, como fonte responsável pela drenagem de recursos públicos, a corrupção é bem menos significativa do aquilo que deixa de ser arrecadado com a sonegação ou, como veremos a seguir, com o que se gasta com outros itens do orçamento público.

Entre 2002 e 2011, o país gastou, em média, 6,3% do PIB para o pagamento com juros e despesas financeiras, algo em torno de R$ 300 bilhões anuais em valores de hoje (Amir Khair, Carta Maior). Ao mesmo tempo, na peça orçamentária de 2013 os gastos previstos pela União com Educação e Saúde são de R$ 71,7 bilhões e R$ 87,7 bilhões, respectivamente. Comparações internacionais não deixam dúvidas quanto ao sub-financiamento dos nossos sistemas de Educação e Saúde (o que não exclui problemas de gestão, ligados à forma de funcionamento da máquina pública no Brasil).

Resumindo alguns pontos: aquilo que deixa de ser arrecado pela sonegação fiscal é quase que 70 vezes mais do que o montante desviado pela corrupção, enquanto o gasto com juros, que se direciona para uma minoria detentora de títulos públicos, é 3,5 vezes maior do que o orçamento da Saúde, supostamente para 190 milhões de brasileiros.

Portanto, a ideia de que todos os problemas se resumem à corrupção dos governos é, na verdade, simplista e totalmente insuficiente para dimensionar os reais desafios do país em oferecer serviços públicos de qualidade. Reforma tributária de caráter progressivo, retomada do crescimento econômico a partir da melhora da relação entre cambio e juros e da recuperação industrial, aumento dos investimentos em infraestrutura e reestruturação da máquina pública e das formas de gestão. São temas essenciais e complexos, ou seja, a vida seria bem mais simples se dependêssemos apenas do bom comportamento dos políticos.http://vggarciatrestemas.wordpress.com/2013/07/17/carga-tributaria-corrupcao-senso-comum-e-servicos-publicos/