29 julho, 2011

A Extrema Direita Domina

Por Walter Hupsel . 26.07.11 - 16h48
Eles venceram

Há algum tempo muitos analistas vêm falando do crescimento da extrema-direita na Europa e no mundo. Eu mesmo já escrevi aqui neste espaço algumas vezes sobre o tema.

Como em todo discurso de ódio, que a caracteriza, a nova extrema-direita precisa encontrar seu inimigo. Se antes este era encarnado nos judeus apátridas, que “vagavam” pela Europa prontos a “pilhar” os recursos dos cristãos, hoje o inimigo atende pelo nome de muçulmano. São seres esquisitos, que às vezes usam uma espécie de turbante, que não acreditam no verdadeiro filho de deus, e que, algumas vezes, interpretam literalmente o que seu deus teria dito através do profeta Maomé.

Este crescimento não é nem tão novidade assim, e tem sua origem no fim do Bloco Soviético. Por um lado, os europeus “ocidentais” se viram ameaçados com aquela massa de pessoas procurando empregos, ansiosos em entrar no modo de vida capitalista. Isso levou a uma depreciação do valor do trabalho. Os novos bárbaros vinham do leste para destruir o sonho da Europa Cristã capitalista.

Por outro lado, os que viviam dentro da cortina de ferro se viram órfãos, jogados num mundo que desconheciam, e por isso temiam. Muito do movimento de completar o círculo e se voltar à extrema-direita foi feita por estes europeus do leste, numa curiosa contradição. Os ocidentais se sentiam invadidos e queriam proteção contra os invasores. Os orientais, novatos no mundo da competição, queriam o mesmo.

Em comum apenas o ódio contra aquele passageiro que chega no ônibus já cheio, cuja presença vai encher ainda mais o veículo, e que, por isso, é  visto com desconfiança pelos “nativos”. Estes, os mais recentes, são aqueles que não conseguem ser abarcados pela definição de Europa, os muçulmanos. Os ódios se juntam contra o terceiro.

Mas isso não interessa tanto. Interessa como a mídia repercutiu os atentados na Noruega na semana passada. Todos os veículos “ocidentais”, sem nenhuma exceção, correram para dizer que seriam obras de…. muçulmanos. As razões beiravam a esquizofrenia coletiva: desde a Líbia (com Kadafi relembrando os tempos da PanAm), até mesmo o Acordo de Paz de Oslo, que deveria por fim ao conflito Israel-Palestina, assinado por Yitzhak Rabin (Israel) e Yasser Arafat (OLP), mediado pelo então presidente dos EUA, Bill Clinton.

Os “especialistas”, atônitos com o ocorrido, tentaram, de toda e qualquer maneira, encaixar uma explicação qualquer que remetesse aos muçulmanos. Qualquer coisa, naquele momento, servia a eles, nos seus delírios, nas suas elucubrações. Diria eu que estavam estado de êxtase hipnótico, apontando o dedo rua afora e vendo fantasmas em todos os lugares.

Desde os primeiros momentos já estava claro, pra qualquer pessoa que tentasse entender o que se passava, que o alvo dos atentados não era a Noruega, ou mesmo o governo, mas sim um partido, uma posição política. Era claro, logo, que o atentado fora levado a cabo por razões internas.

O alvo, o modus operandi, tudo indicava solidamente pra nacionalistas noruegueses, para extrema-direita. Mas a mídia olhou, e não viu. Não quis ver.

Quando finalmente enxergou, as características “religiosas” do assassino, do terrorista norueguês, foram esquecidas. Ele tornou-se uma radical louco, um homem perturbado aos olhos dos jornais. Afinal era um de nós.

A mídia, seus intérpretes, seus analistas com doutorado em grandes universidades, especialistas em Relações Internacionais, em terrorismo, compraram acriticamente o discursos da extrema-direita do inimigo da Europa.

Neste quesito, tristemente posso falar: ela venceu. Pautou a mídia, espalhou o medo do outro e, como demonstrou, conquistou mentes.http://colunistas.yahoo.net/posts/12608.html
publicada sexta-feira, 29/07/2011 às 10:44 e atualizada sexta-feira, 29/07/2011 às 11:24



A era do preconceito
Por Celso Amorim, da CartaCapital

Nesta era da internet a informação é instantânea. A desinformação também. A notícia sobre os trágicos atentados de Oslo chegou-me enquanto eu navegava pelos sites que costumo frequentar para me atualizar sobre o que ocorre no mundo. Pus-me imediatamente em busca dos detalhes. Abri a página de uma respeitada revista internacional. Além de alguns pormenores, obtive também a primeira explicação, que veria em seguida nas versões eletrônicas dos jornais brasileiros, segundo a qual o perpetrador dos atos terríveis era alguém a serviço de um movimento fundamentalista islâmico. Dois dias depois do acontecido, quando ficou claro que, na verdade, se tratava de um extremista de direita que pertenceu a movimentos neonazistas, ainda é possível encontrar, mesmo com ressalvas (porque a internet comete essas “traições”), a mesma interpretação apressada, baseada no preconceito contra muçulmanos.

No caso da revista internacional, a interpretação não se limitou a essa caracterização genérica. Deu “nome e endereço” do facínora, que seria um iraquiano curdo ligado a sunitas fanáticos, vivendo no exílio desde 1991. O articulista foi mais longe. Apontou as possíveis motivações do crime hediondo, que estariam relacionadas com a presença de tropas norueguesas no Afeganistão e com a percepção, por parte dos tais fundamentalistas, da cumplicidade da imprensa norueguesa com caricaturas ofensivas ao Profeta.

Evidentemente, tudo isso era muito plausível, à luz do ocorrido no 11 de Setembro, descartando-se as hipóteses conspiratórias sobre aquele trágico episódio. Mas era igualmente plausível a hipótese, que acabou confirmada, de que se tratasse de outro tipo de fundamentalista, do gênero “supremacista branco”. O alvo do ataque era um governo da esquerda moderada, visto como tolerante em relação a imigrantes e aberto ao diálogo com as mais diversas facções em situações conflituosas, inclusive no Oriente Médio. Para sublinhar a natureza ideológico-religiosa do ato de violência, o terrorista visou também a juventude do partido, pacificamente acampada em uma ilha.

Algo semelhante havia ocorrido seis anos antes do atentado contra as Torres Gêmeas, quando outro fanático havia feito explodir um prédio público na cidade de Oklahoma, nos Estados Unidos. Daquela feita, o Estado – e tudo o que ele simboliza como limitação ao indivíduo, percebido como independente e antagônico em relação à sociedade – foi o objeto da ira destruidora. Também naquela época, quando a Al-Qaeda ainda não havia ganhado notoriedade, as primeiras análises apontaram para os movimentos islâmicos.

Não ponhamos, porém, a culpa na internet. Ela apenas faz com que visões baseadas em preconceitos, que não deixam de refletir certo tipo de fundamentalismo, se espalhem mais rapidamente, com o risco de gerarem “represálias” contra o suposto inimigo. Felizmente, neste caso, a eficiente ação da polícia norueguesa impediu que isso ocorresse. Mas o risco existe de que, em outras situações, as tragédias se multipliquem, por vezes com o apoio de movimentos marginais inconsequentes, que buscam tirar partido dos eventos, assumindo responsabilidade por algo que não fizeram.

Não é possível ignorar que, no caso da invasão do Iraque, o preconceito, e não apenas a manipulação deliberada (que também existiu), estava por trás de vinculações absurdas, usadas para justificar decisões que causaram centenas de milhares de vítimas (há quem fale em 1 milhão). O suposto elo entre Saddam Hussein e o terrorismo nunca se comprovou, da mesma forma que eram falsas as alegações quanto à posse por Bagdá de armas de destruição em massa. Num primeiro momento, contudo, essas justificativas foram aceitas pela maioria da população norte-americana.

Não sejamos inocentes. Interesses econômicos e políticos, e não apenas preconceitos, motivaram a decisão de atacar o Iraque. Mas o pano de fundo de uma visão particularista do mundo, em que “diferente” se torna sinônimo de “inimigo”, ajuda a criar o caldo de cultura de que se valem os líderes para obter, das populações que governam, o indispensável apoio às suas custosas aventuras bélicas.


A Noruega não corre esse risco. Como disse o primeiro-ministro Stoltenberg, o terrorismo insano não destruirá a democracia do país nórdico, que, ademais, se tem notabilizado por importantes iniciativas em favor da paz. Aliás, é o ódio às pessoas que promovem a paz e o entendimento, além da intolerância e do fanatismo, que está na raiz desse bárbaro atentado. Infelizmente, não só o orgulho, como queria a romancista inglesa, mas também o ódio costuma ser um companheiro inseparável do preconceito.


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